Os dois textos abaixo abrigam as conclusões do I Encontro Interno do Núcleo Celso Furtado, do PT-RJ, processo cuja plenária final aconteceu em 6 de dezembro de 2012, no auditório do Sintcon.
Os documentos tratam, respectivamente, de análise de conjuntura ("Treze sugestões sobre o quadro político") e organização interna ("Núcleo Celso Furtado: uma tentativa de balanço").
Sua autoria – cujo trabalho se acha relatado pelo companheiro Marcelo Barbosa – é rigorosamente coletiva e as ideias aqui desenvolvidas representam uma contribuição ao debate travado no interior da esquerda e, em especial, nas fileiras do Partido dos Trabalhadores.
Um abraço, boa leitura e viva o 8 de Março!
Kadu Machado- Coordenador do Núcleo
Um abraço, boa leitura e viva o 8 de Março!
Kadu Machado- Coordenador do Núcleo
Treze sugestões sobre o quadro político
1- A sentido do processo – Abusando da dialética, o bardo inglês teve a ocasião
de afirmar: “tudo que vive, deve morrer”. Situação que, em certo sentido, se
aplica à atual conjuntura. Se fosse para eleger um aspecto capaz de recortar,
dentro de si, um emblema do movimento histórico experimentado pela sociedade
brasileira, na atual quadra, a escolha recairia sobre a necessidade da
ultrapassagem do legado do presidente Lula. Não porque deu errado e, sim por
que deu certo. É, em torno das alternativas ao ciclo de transformações
inaugurado em 2003 – agora exibindo sinais de esgotamento – que se deslocam as
ações e análises dos participantes e observadores da vida pública. Refletindo a
heterogeneidade de interesses e aspirações envolvidas, a infinidade de projetos
se desloca na direção de três campos de gravitação política: I- o espectro
neoliberal, que pretende simplesmente o cancelamento do legado de Lula e de sua
passagem nas práticas e no imaginário social dos brasileiros; II- os setores
interessados na consolidação de um projeto de crescimento econômico, sob a
liderança do grande capital, afirmando a ordem burguesa, com representação
dentro e fora do nosso governo e; III- as vertentes que pretendem construir
hoje as fundações de um projeto de nação cujo embrião está presente no texto da
Carta de 1988.
2- Por projeto nacional – Entendemos a mobilização presente de esforços no
sentido de criar as bases teóricas, programáticas e culturais para, numa dinâmica
provavelmente associada ao longo prazo, pôr em prática as transformações que a
sociedade brasileira requer para se transformar numa nação capaz de assegurar a
todos os seus cidadãos o exercício efetivo de direitos e garantias
individuais e, sobretudo coletivos. Entre as medidas a serem adotadas – ainda
obstaculizadas pela correlação de forças atual – se incluem: assegurar o caráter
público e universal à educação e à saúde; implantar o imposto sobre grandes
fortunas; taxar fortemente os lucros das empresas monopolistas; realizar uma
reforma agrária em grande escala combinada com a formação de uma agroindústria
ecológica; submeter o sistema bancário ao interesse coletivo; assegurar o controle
público das ações do Estado; descriminalizar o aborto; democratizar os meios de
comunicação em todos os níveis; pôr fim à concentração fundiária urbana;
garantir o domínio do país sobre seus recursos materiais, sobretudo os de
natureza hídrica; intensificar os trabalhos de unificação política e econômica
dos países latino-americanos; proteger os biomas ameaçados pelos interesses
econômicos; mudar radicalmente o modelo de transporte público hoje
inviabilizado pela opção pelo aumento da frota de automóveis; entre outros.
Conquistas, enfim, que deverão ser fruto da ação de uma nova maioria política e
cultural formada pelo proletariado urbano e rural, pelos camponeses, camadas médias
urbanas unidas aos movimentos sociais expressão dos anseios de mudança da
juventude, das mulheres, dos negros, índios, grupos GLBT e populações
quilombolas. Por certo, tal articulação não se confunde com o atual projeto de
acumulação de capital no qual nosso governo e nosso partido tentam negociar e
inserir algumas reivindicações dos setores da base da pirâmide social.
3- O
ambiente externo – Qualquer projeto
de nação tem, na abordagem das relações entre países e organismos
multilaterais, uma importante ferramenta de compreensão da realidade. Contudo,
indagar o papel do Brasil no mundo não constitui tarefa simples. A cautela
recomenda, num texto de proporções reduzidas como este, a remissão a traços
gerais. Especialmente no que concerne ao ambiente de tensões no qual se opera a
presença do Brasil no cenário externo. A maior delas, a crise econômica mundial
iniciada em 2007. Evento com todas as condições de evoluir para uma convulsão
social e política (em especial na Europa), a crise acelera a dinâmica de ascensão
da China ao status de grande potência econômica. Nas últimas décadas, o leste
asiático se converteu no principal centro manufatureiro mundial. Apesar da decadência
relativa dos EUA como centro geopolítico (ainda que fortemente agressivo, como
atesta a intervenção no Afeganistão e na Líbia), a economia norte-americana já
mostra sinais de recuperação. Ademais, os EUA continuam sendo a principal
superpotência militar do mundo. Ao Brasil, país semiperiférico situado na área
de influência do Gigante do Norte, mais que promover o intercâmbio econômico,
incumbe ampliar a cooperação diplomática e cultural com nossos vizinhos da América
Latina e da África, vedado o recurso a protocolos de espoliação de nações mais
pobres que a nossa.
4- Dilma e a crise – É no enfrentamento da turbulência causada pela bolha
financeira nos EUA e na Europa que mais transparecem semelhanças entre as
administrações petistas à frente do executivo nacional. Tanto Dilma quanto Lula
priorizaram uma estratégia de crescimento econômico sem derivas recessivas tão
a gosto dos neoliberais. De igual maneira, o quadriênio inaugurado em 2011 viu
expandir o alcance e a variedade dos programas e políticas sociais. Tendo
prosseguido, de igual sorte, as propostas de correção dos desequilíbrios
regionais responsáveis pelo retorno das regiões Norte e Nordeste ao mapa da
atividade econômica brasileira. Acrescendo a uma lista de símbolos e marcas do
governo Lula que se projetaram no programa – e na ação – de sua sucessora não é
possível esquecer das iniciativas, inclusive as legislativas, para recuperar e
ampliar o poder de compra do salário-mínimo. Seria um ato de injustiça, no
entanto, deixar de observar, em meio a tanta preocupação com a continuidade, o
empenho de Dilma em criar ênfases próprias no que se refere ao seu estilo de
governar. Tais marcas estão visíveis. Elas se manifestam em fenômenos como a
mobilização da presidenta em favor de uma derrubada consistente dos juros
praticados pelas instituições financeiras, um dreno que asfixia historicamente
a economia do país. São também pontos a contar a favor da atual gestão do
executivo o combate – mais explícito que em Lula – à corrupção no âmbito da
administração pública.
5- O risco de privatização da gestão pública – Sob a superfície da tensão entre a continuidade e
adoção de uma face própria, entretanto, já afloram indícios de que alguns
setores da atual administração vêm tomando distância do conjunto de princípios
e práticas daquilo que se convencionou chamar de “modo petista de governar”. Os
tópicos deste ajuste são especialmente preocupantes. Entre outros sinais,
incluem a aceleração da transferência da gestão de áreas de atuação do poder público
para a iniciativa de particulares. Em especial, dissemina-se o formato das
chamadas PPPs (parcerias público-privadas) e OSs (Organizações Sociais),
instrumentos de ação cujo impacto sobre as instituições ainda não foi de forma
alguma avaliado. O que se pode esperar disso? Ao que parece, o aumento da
musculatura do grande capital e sua margem de manobra para relegar o Estado à
condição de repassador de lucros privados. Aliás, diante das dificuldades de
controle e fiscalização de tais parcerias se torna fácil enxergá-las na condição
de mais uma estrela no firmamento da corrupção institucionalizada que marca a
trajetória patrimonialista brasileira.
Curiosamente, os riscos
assumidos com a disseminação das PPPs e OSs pela administração pública parecem distantes do modelo de Estado
originariamente preconizado pela presidenta. Tanto no que se refere ao discurso
quanto à prática. Por certo, Dilma acenou com uma outra agenda (que está sendo
posta em prática, mas de modo parcial). Esse agregado inclui: profissionalização
dos agentes da administração direta e indireta; racionalização dos processos de
gestão; aumento da transparência das ações do Estado; fiscalização permanente
sobre as concessões e permissões delegadas a particulares; introdução de novos
recursos tecnológicos; e, sobretudo, a democratização do acesso e controle da
população – especialmente os mais pobres – sobre os bens e serviços públicos. Não
é difícil concluir que o eixo estruturante de um conjunto de políticas assim
passaria pelo combate à formação de monopólios privados. E aí justamente o
oposto ocorre.
Concebidos durante os anos
de fastígio neoliberal, os mecanismos de privatização da gestão pública – em
especial as chamadas OSs e PPPs – fazem parte de uma constelação de valores
alheia ao pensamento econômico da esquerda, em seus diversos matizes. Disso
ninguém duvida. Mesmo assim, a presença de tais institutos se acha
perigosamente naturalizada na paisagem da administração pública brasileira
desde 1990, inclusive em governos petistas. Em benefício da cidadania, chegou a
hora de controlar a intensidade e a extensão do uso de instrumentos de gestão
terceirizada. Só assim será possível conceber modelos de transição capazes de
impulsionar o Estado no rumo da afirmação do seu caráter republicano.
6- O grande capital – Grande beneficiária de uma mudança na economia à
qual não deu causa e à qual, muitas vezes se opôs, a fração mais endinheirada da
classe dominante brasileira – aquela associada aos interesses da fusão do
capital financeiro e indústria, local e externo – demorou a perceber as
oportunidades que se abriam diante de si. Tanto assim, que apostou duas vezes
em candidaturas tucanas em 2006 e 2010. Mantida à margem da iniciativa política,
esse setor – quase tutelado por Lula – agora aspira à autonomia. Em busca do
tempo perdido celebra uma pax
produtiva para investir, com avidez, sobre os recursos públicos postos à
disposição pelas agências governamentais, a exemplo do BNDES (outra nota
preocupante, associada aos humores do “mercado”, acusa o aumento de aquisição
do controle de acionário de grandes empresas nacionais por corporações
transnacionais).
7- O governo e os movimentos sociais – Essa re-acomodação das relações entre público e
privado no âmbito das instituições brasileiras de Estado coincide – e talvez não
seja por acaso – com a deterioração dos laços entre governo e os atores sociais
mais à esquerda. Não à toa, os movimentos sociais já se pronunciam de uma forma
distinta do comportamento adotado sob Lula. A parceria conflitiva deu lugar ao
dissenso. Definha o diálogo com os ambientalistas, povos da floresta, coletivos
feministas, entre outros grupos; ao mesmo tempo em que emerge uma truculência
inédita no trato das reivindicações dos grevistas da área do funcionalismo público.
Sintomaticamente, o representativo Congresso Camponês em Brasília, no mês de
setembro de 2012 – marco da unificação de todas as entidades dedicadas aos
interesses dos trabalhadores rurais a exemplo do MST e da Contag – avançou para
a elaboração de um programa e uma prática de autonomia frente às autoridades
constituídas. Essa diretiva adotada pelos trabalhadores do campo talvez sirva
de baliza para o movimento sindical urbano, atualmente dividido entre o apoio
ao uma reforma trabalhista destinada a ceifar direitos historicamente consolidados
e a afirmação do caráter político da ação dos sindicatos.
8- O Congresso e a base aliada – Repercutindo a Crise da Representação Política que
assola a democracia em todos os quadrantes do globo, o Poder Legislativo
Brasileiro também exibe, no entanto, distorções que lhe são particulares: a
principal delas, o vínculo de subordinação que mantém com executivo desde os
tempos da ditadura militar. Sinal dos tempos, a coalizão governista não pára de
inchar, com a incorporação inclusive de setores ferrenhamente oposicionistas até
um passado recente. Curiosamente, essa formação de maioria parlamentar pouco ou
nada contribui no sentido de dotar de nitidez e consistência o debate político
travado no Senado e na Câmara. A chamada base aliada – fortemente atravessada
pelos interesses corporativos do agronegócio e do capital financeiro, sem falar
dos pleitos gerados pelo conflito entre diferentes unidades da Federação –
frequentemente expõe o planalto a derrotas em votações importantes,
evidenciando a fragilidade das estruturas e lideranças partidárias. Foi assim
no episódio da aprovação do Código Florestal e na divisão dos royalties do petróleo.
Para o Congresso Nacional, adotar um novo padrão de relacionamento com o
Executivo, figura entre as providências necessárias à recuperação da Representação,
sem a qual a democracia parlamentar se estiola.
9- A oposição liberal – Em seus vários segmentos, incorporou mais uma tática
a seu repertório de possibilidades. Não que tenha renunciado à dissidência
sistemática ou à orquestração dos ataques da mídia monopolista ao PT e ao
governo. No entanto, para além da atitude de confronto, parte desses setores vêm
aderindo à base aliada no Congresso Nacional e ocupando espaços no executivo em
pastas afeitas ao seus interesses. Para potencializar suas pretensões, criaram
um partido, o PSD, do ex- prefeito Kassab. Aparentemente favorável aos
objetivos da ampliação da sustentação do governo, esse expediente apresenta
alguns problemas: entre os quais, de um lado, pode contribuir para minar os
esforços de reeleição de Dilma, “por dentro”; e, de outro, permite exercer um
discreto aceno a aliados do nosso governo, mesmos os mais à esquerda,
interessados em ampliar sua presença num novo arranjo de forças, marcado pela
exclusão do PT.
10- O Judiciário e o chamado Mensalão – Em sentido diametralmente oposto ao Congresso, o Judiciário
busca reafirmar sua independência e inteireza moral de uma maneira infeliz.
Pelo menos é isso que se depreende do andamento da ação penal 470, o denominado
Mensalão, julgamento no qual o princípio da inocência presumida foi
perigosamente relativizado. Reagir diante desse equívoco significa, para o PT,
além da solidariedade aos companheiros atingidos por uma decisão de rigor
exagerado, mobilizar a sociedade em favor de uma reforma política cujos
elementos de maior relevo consistam no financiamento público de campanha e a
adoção do voto em lista partidária.
11- O Rio de Janeiro – Para nós, que vivemos e atuamos no Rio de Janeiro,
as modificações no quadro mais geral do país não apresentam novidades. Um
grande ensaio ocorreu por aqui. Tanto no nível da capital quanto no estado, as
tendências operaram no sentido do reforço da privatização das estruturas da
administração pública, sendo o principal agente de tais processos o PMDB.
Fatias inteiras das áreas de transporte, contratação de pessoal e,
principalmente saúde, foram servidas ao apetite de grandes grupos empresariais.
Uma resistência, no entanto – ainda incipiente – começa a tomar forma. O
percentual de votos dirigido à candidatura de Marcelo Freixo indica o grau de
erosão do apoio às políticas privatistas. Sinaliza, de igual forma, as chances
concretas da candidatura de Lindberg Farias, consensual dentro do campo
petista, desde que seja capaz de articular a política de alianças e a estrutura
logística necessárias a um embate com um inimigo poderoso.
12- O papel do PT – Exibindo a crise mundial como espantalho, a velha elite busca retomar a
iniciativa do processo político e social brasileiro. Sonha com a retomada do
clima das décadas de 1980 e 1990. Já não sente vergonha de falar abertamente em
privatização, aumento de juros e desnacionalização da economia. Será bem
sucedida em seu intento? Só o futuro dirá. O que se pode prever é que, em vista
do predomínio de setores democráticos e de esquerda no governo da Presidente
Dilma, isso sem falar da firmeza de propósitos da presidenta, é possível
construir uma lógica de construção republicana à frente da condução dos
assuntos de Estado. Entre os destacamentos a se apresentar ao combate, um se distingue:
o Partido dos Trabalhadores, agremiação da qual se espera a recusa ao papel de
homologador dos interesses da afirmação da ordem burguesa no Brasil.
13- Concluindo – O ciclo de transformações inaugurado em 2003 – marcado
pela bem-sucedida incorporação de milhões de brasileiros mais pobres ao mercado
interno de consumo – atingiu seus limites. E, por certo, não há receita pronta
para dar prosseguimento a esta herança. No entanto, pelo menos três princípios
devem estar contemplados: o alargamento do estágio de democratização da
sociedade; a ativação dos movimentos sociais e; a orientação do Estado no
sentido da afirmação do seu caráter republicano. Sem a reeleição de Dilma, em
2014, será muito difícil alcançar esses objetivos.
Núcleo Celso Furtado: uma tentativa de balanço
Fundado há cerca de três anos e meio, tendo participado de
várias campanhas eleitorais e de inúmeras movimentações da cultura e da
política no âmbito da cidade, o nosso núcleo demanda, há tempos, uma mirada retrospectiva.
O presente documento serve a este objetivo. No texto, estão presentes elementos
de destaque a um esforço de recenseamento das grandezas e limites presentes na
prática coletiva de todos nós. Evidentemente, o conjunto de questões propostas
aqui não esgota a discussão. Outros aspectos podem – e devem – ser trazidos
pelos companheiros. Ou seja, deliberadamente resumido, este balanço constitui
ponto de partida e, não horizonte de reflexão, num tempo que se anuncia crucial
para o resgate da identidade política e programática do PT.
Um núcleo
diferente
Como se sabe, o PT teve sua origem nos movimentos sociais,
sempre retirou a sua seiva das formas de associativismo urbano e rural, em
particular dos sindicatos. Mesmo quando ficou bandeira à frente dos executivos
dos três níveis do poder federativo, a legenda de lula jamais renegou tal
compromisso. Numa sociedade tão marcada pelo verticalismo das instituições
políticas, esta atitude não deixa de ser extremamente saudável – dada a
possibilidade da crítica da representação política que tanto distancia cidadãos
e governos. Por certo, a afirmação da cultura política do partido, de matriz
basista, não ocorreu sem atritos: o PT acusou dificuldades em áreas como o
parlamento, o poder executivo e, mesmo o judiciário, entre outros níveis.
Da mesma maneira, a militância da agremiação sempre mostrou
dificuldades em lidar com a chamada questão nacional.
A adoção de uma agenda de Estado voltada para a superação do
atraso estrutural brasileiro em vários níveis – político, social e econômico,
entre outros nexos – sempre pareceu, ao PT, um tema da velha esquerda, em
particular dos trabalhistas e dos comunistas. Por certo, havia razões para tal
entendimento. Os processos de aprofundamento da dependência dos países periféricos
às economias centrais haviam se agudizado por todo século XX, reduzindo a
margem de manobra dos Estados nacionais. O episódio neoliberal dos últimos
30/40 anos reforçou enormemente tal tendência. Porém, a necessidade da retomada
do chamado desenvolvimento repôs – é bem verdade sem a exuberância das décadas
de 50 e 60 do século XX – da discussão do Estado como agência promotora de
novos patamares de igualdade entre cidadãos. Confrontado com necessidades
ditadas pela realidade, os governos do PT aderiram ao planejamento e ao reforço
do setor público da economia. Para além do território da economia, as
administrações petistas também incentivaram a consolidação de organismos de
controle e fiscalização dos bens públicos com a CGU, o Ministério Público e a
Polícia Federal.
Essa incorporação da questão nacional ao ideário petista
ocorreu de maneira incompleta. Isto é, não se faz acompanhar, até o momento de
elaboração de um projeto nacional de largo fôlego. Falta construir a iniciativa
prática e teórica capaz de transformar em realidade os projetos alinhavados ao
longo do texto da Constituição Cidadã, de 1988, Nosso núcleo nasceu, com suas
limitações, para colaborar no suprimento dessa lacuna, contribuindo para
despertar na militância petista o interesse na discussão das questões do Estado
e suas agências, sem descuidar da defesa dos interesses da sociedade civil, em
especial dos movimentos sociais. A escolha de nome do seu patrono já indica tal
intento. Homenagear Celso furtado significava cultivar o exemplo de um quadro
político que dedicou a vida à construção de uma nação soberana e justa sem
jamais abdicar das causas referentes ao aprofundamento da democracia rumo ao
socialismo.
Refletindo o interesse no enlace entre questão nacional e
questão democrática, nossas principais frentes de atuação, a saber, o Jornal de
cultura e política Algo a dizer e o Instituto Casa Grande, passaram a
repercutir a orientação do núcleo, sem prejuízo do perfil pluralista e aberto
(ecumênico, mesmo) presente nestas duas entidades. O resultado está expresso
nos debates realizados entre 2009 e 2011, primeiro no auditório do Sindicato
dos Advogados e depois, no mezanino do Teatro Grande, discussões cujos
resultados foram amplamente noticiados – quando não integralmente reproduzidos
– nas edições eletrônicas do Algo a Dizer. Um grande empenho em produzir
opinião. Com isso, a influência das entidades mencionadas – e indiretamente a
do núcleo – vêm crescendo junto à intelectualidade artística e acadêmica.
Paralelamente, a realizações das discussões propiciou o aumento da massa
crítica e elevou o nível dos militantes. Assim, com todas as nossas
debilidades, pudemos produzir documentos de análise e intervenção sobre todas
as movimentações mais importantes da conjuntura nos últimos três anos.
Em 2012, tais iniciativas alcançaram um novo patamar: a
publicação do livro “Território Livre da Democracia: Os Novos Debates do Teatro
Casa Grande”, lançado pela editora de um companheiro ligado ao núcleo, serviu
para aprofundar nossas relações com outros grupos de ativistas políticos, em
especial aqueles vinculados ao MST e à revista virtual Estopim. Mas, nossa
presença também foi registrada noutras áreas. A principal delas foi a
incorporação de um grupo de gestores de políticas públicas do Estado do Rio de Janeiro
à estrutura orgânica desta organização de base.
Definida uma certa
especialização nas práticas políticas e organizativas do núcleo, algumas
frentes de trabalho não tiveram o mesmo rendimento daquelas definidas como
prioridade. Tal sistemática precisa ser revertida. Exemplo disso pode ser
enxergado no trabalho iniciado em 2010, na região Portuária e do Morro da
Providência, por época das eleições daquele ano: dada a quantidade elevada de
filiações envolvida, a juventude dos quadros agregados e as possibilidades de
crescimento no local, era de esperar um cuidado e planejamento maiores do
aqueles aplicados na ocasião. O
que não ocorreu. Na medida em que remanescem alguns (poucos) quadros daquela
experiência, talvez seja o momento de retomar o trabalho em outras bases. Por
fim, no que refere a presença de militantes do núcleo na diretoria do bloco
Devassos da Cardeal, de Santa Tereza, aparece aí mais uma potencialidade a ser
explorada em vista do caráter agregador das manifestações de cultura popular como
o samba e o carnaval.
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