30 de setembro de 2012

Hiroíto, o rei (cinema)


Por Jorge Nagao

Rei? Não, estranharão alguns leitores, Hiroíto foi imperador. Então, esclareço que trata-se  de um Hiroíto brasileiro cujo pai era fã do país do sol nascente. Yamaguchi Falcão, boxeur medalha de bronze  nas Olimpíadas de Londres, é um belo exemplo dessa reverência prestada por seu pai a um amigo nissei. Quantas Sayonaras existem por aí como a filha do jogador palmeirense Obina.
Idolatrado no Japão e respeitado no exterior, o nome do imperador japonês foi recorrentemente registrado em cartórios do Brasil especialmente nos anos 30 e 40. O pai de Hiroíto de Moraes Joanides, um grego, não imaginava que o seu filho se tornaria um rei. 
Filho de uma família de classe média, Hiroíto, paranaense de Morretes, nasceu em 1936. Teve uma infância normal. Sua vida mudou quando foi à chamada boca do lixo para satisfazer os seus hormônios em ebulição. Gostou do local. E voltou muitas vezes. 
Em 1957, seu pai foi assassinado a navalhadas. Hiroíto foi acusado pelo crime  mas não foi preso. Decidiu mudar para o chamado quadrilátero do pecado. Não como um simples morador, mas sonhando em ser o imperador daquele submundo no centro da cidade, nos arredores da estação rodoviária paulistana no final dos anos 50.
Franzino, de óculos, culto, não tinha outra opção para se impor a não ser portando armas. Comprou dois revólveres porque as navalhas começaram a ficar restritas aos salões de barbeiros. Ao presenciar uma agressão à uma prostituta, esmurrou o agressor que revidou com pauladas; acuado, Hiroíto sacou a arma e matou pela primeira vez. Passou a ser admirado pelas pecadoras. Tempos depois, desacatado quando jogava bilhar, o “japonês”,  como era chamado, não hesitou: passou fogo no desafeto. Mesmo assustado com a sua atitude, sentiu-se o cara. Era o início da carreira do poderoso chefão.
Logo, de boca em boca, o seu nome foi crescendo na boca do lixo. Com muita astúcia e crueldade, traficando drogas e corrompendo policiais, Hiroíto foi dominando ruas e quarteirões. Quando era preso, um pacote de dinheiro resolvia o seu problema. Traficando, assasinando friamente os seus concorrentes, virou o rei da boca. Dormia pouco pois era perseguido tanto por policiais quanto por bandidos. Para se manter vigilante drogava-se constantemente. Reinou por três ou quatro anos, até que um dia, a casa dele caiu.
Preso durante sete anos, escreveu o livro “Boca do Lixo”, lançado nos anos 70 e relançado neste ano pela Labortexto. O livro retrata aquela São Paulo dos anos dourados e a trajetória do “japonês” que queria ser amado e tinha o prazer de ser temido, conforme anuncia o filme “Boca”, de Flavio Frederico. A crítica destaca as magníficas atuações de Daniel de Oliveira e Hermila Guedes. O filme que levou quatro prêmios no Festival de Recife, estreia nos cinemas em 28 de setembro. Lançado em DVD no exterior como “Boca the real goodfather” foi muito elogiado pela reconstitução da época pelo renomado jornal Variety. Para quem gosta de ação e não se importa com tantos tiros, consumo de drogas e safadezas em geral, como mostra o thriller, é um prato cheio.

Jorge Nagao é escritor e jornalista

Um comentário:

  1. Pronto! Você me deixou curioso para ver esse Hiroito, O Imperador, digo, Rei. Baitabraço. Luca.

    ResponderExcluir